sábado, 29 de agosto de 2009

Justiça suspende, parcialmente, reintegração de posse na Vila Tupi

O que parecia impossível hoje é uma realidade para os moradores da Vila Tupi, em Bertioga. Prestes a registrar a maior reintegração de posse no Município, mais de 250 famílias poderiam ter um destino diferente senão fosse a revogação, parcial, da decisão judicial sobre a reintegração de posse prevista para o dia 24 de agosto, que desabrigaria mais de mil pessoas. O prefeito Orlandini fez questão de reunir mais de 800 pessoas para "dar a boa notícia" na tarde desta quarta-feira (19).

De forma bastante curiosa, a decisão só foi tomadapós os moradores, organizados, demostrarem disposião de resistir ao despejo, já montado pela Polícia Militar, sob a chefia do Capitaão PM Rocha, e pelas demais autoridades. O clima era de confronto e o alívio só veio no dia 18 de agosto, quando o juiz da 6ª Vara Cível da Comarca de Santos, Joel Birello Mandelli, revogou a decisão e repensou a reintegração de posse da área de 70 mil m². Com a nova decisão nesta segunda-feira (24), a partir das 7 horas, apenas 1.386 m² deverão ser desocupados. No local em questão não há nenhuma residência, apenas comércio, em frente a Avenida Anchieta.

Mesmo com a ação já transitada e julgada, a população afetada não havia perdido a esperança. Desde o dia 10 de julho, quando foram notificados sobre a operação,o marcada inicialmente para o dia 27 de julho, o pânico se instaurou na região. O prefeito, percebendo a possibilidade de conflito violento, de imediato cancelou todos os compromissos agendados para dedicar-se a achar uma solução legal negociada, junto aos moradores em pé de guerra, para o caso, que já se arrastava há mais de 25 anos na Justiça.

“O primeiro passo, é pedir para o juiz mais prazo, para dar tempo de trabalhar uma ação'', disse o prefeito na época.

Na mesma semana, a Prefeitura encaminhou um ofício ao Judiciário, informando todas as dificuldades do Município em suportar uma reintegração do porte da Vila Tupi. Além disso, o próprio prefeito fez questão de ressaltar que no local moravam muitas famílias, que foram enganadas e que elas estavam dispostas a pagar para o proprietário, mas era preciso haver cautela.

“Não podemos tomar qualquer decisão, sem antes entender esse processo que é tão complexo”.

Como se vê, a mobilização e o temor de uma resistência tornaram até as autoridades municipais, geralmente coniventes com a grilagem que campeia em Bertioga, bem "razoáveis". Mas o terreno vale muito dinheiro e a Justiça insistia em entregá-lo ao proprietário. Com a negativa do Judiciário em relação ao prazo, o prefeito recorreu a Polícia Militar e encaminhou ofício para a corporação. No documento, o Chefe do Executivo expôs toda a preocupação em relação "à segurança dos moradores com a reintegração de posse" (leia-se "resistência armada ao despejo por parte da população"). A Polícia Militar, por sua vez, "entendeu as razões do prefeito" e decidiu somar aos apelos do administrador (ou seja, botou o galho dentro) e também pediu mais prazo para o Judiciário, alegando a "falta de planejamento", visto que "o prazo com que a corporação foi notificada teria sido insuficiente para planejar a ação".

Desta vez, o prefeito somou forças e conseguiu êxito. A Justiça decidiu adiar para o dia 24 de agosto, mas essa decisão só saiu na tarde do dia 24 de julho, era mais um mês de prazo, começava uma nova fase.

Idas e vindas

Nessa nova fase, a primeira etapa foi tentar negociar com o advogado dos proprietários o pagamento, por parte dos moradores, daquela área. Foi em vão. Irredutível, o advogado dos proprietários (que está de olho no dinheiro do terreno) disse que "não faria acordo com os moradores". Após a negativa na negociação, começaram as idas e vindas para evitr uma insurreição. Sempre com o apoio da Associação dos Moradores da Vila Tupi, da Câmara Municipal e dos advogados de alguns moradores, Orlandini, apavorado, fez reuniões, conversou com advogados especialistas na área de regularização fundiária, conseguiu apoio da Secretaria Estadual de Habitação e fez diversas reuniões, para mergulhar no processo que levava mais de 25 anos.

Questionando, um morador botou o prefeito na parede durante uma reunião no gabinete: “E se tivermos que sair, prefeito?”

“Não estou pensando nisso, porque tenho certeza que vocês não irão sair.”, disse o prefeito no dia 3 de agosto, em uma reunião com os moradores no Gabinete da Prefeitura (o que ele já sabia?).

Já no dia 18 de agosto, pelo juiz Mandelli, diante da pressão continuada da burguesia local para evitar um confronto de conseqüências imprevisíveis para uma região já socilamente explosiva, "reavaliou" o processo e "retificou" a decisão, que parecia impossível de ser revertida: "...foi retificada a área de imissão de posse do imóvel localizado à Avenida Anchieta, conhecida como Vila Tupi, designada para o dia 24 de agosto, sendo reduzida para a medida de 1.386 m²" (Nada como um pouco de pressão!).

Comemoração

“Agora posso dormir em paz”: essa foi a frase mais dita pelos moradores na manhã desta quarta-feira (19), na Vila Tupi, por volta das 8 horas, quando uma queima de fogos foi feita no local, para comemorar a vitória.

O caso de despejo da Vila Tupi sensibilizou toda a população de Bertioga, que passa de 44 mil pessoas. Cada decisão favorável era comemorada de forma coletiva, mas o sofrimento daquelas famílias era especial. Todos imaginam, mas somente eles sentiam na pele a incerteza de perder uma casa própria construída e melhorada ao longo de toda uma geração.

Próximos passos

De acordo com os moradores, o objetivo é continuar a luta e buscar uma decisão definitiva para a Vila Tupi. O caso continua pendente, pois o proprietário deverá recorrer da decisão do Juiz Mandelli ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. A Prefeitura de Bertioga, após o susto que tomou, entrou como parte interessada no processo, e deverá entrar com uma ação coletiva para beneficiar todos os moradores do local. 'A Vila Tupi será um exemplo para Bertioga', disse o prefeito.

Concordamos com isto, mas não no sentido usado por Orlandini. Ficou provado que só a resistência a todo custo, pelos meios que forem necessários, faz recuar os especuladores e o Estado. Aprendamos esta lição, válida para a Vila Tupi, para Bertioga e para todas as áreas na mesma situação.

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